Minha imunidade vacilou. E agora?
- Luana Lessa
- 4 de mai. de 2021
- 5 min de leitura
Acredito que um dos maiores obstáculos durante meu tratamento foi a bendita imunidade, mas confesso que por alguns momentos eu também a considerei minha maior aliada. A quimioterapia citotóxica é um tratamento agressivo e infelizmente não seletivo, por isso, tanto as células cancerígenas como as células saudáveis acabam morrendo durante esse processo e é de se esperar que a imunidade de um paciente acabe por vacilar. Caso isso ocorra, recursos como o uso de injeções que estimulam a produção de células do sistema imunológico são utilizados.
A quimioterapia para o meu tipo de câncer era feita de maneira ambulatorial, ou seja, eu ia até o hospital, passava pelo exame de sangue e quando liberada fazia a aplicação das medicações por algumas horas e depois ia para casa. A primeira dosagem normalmente é feito sob internação para ver se não a nenhum tipo de reação e a princípio correu tudo bem - engano meu porque as reações vieram depois - . A duração e os tipos de efeitos que surgem para uma pessoa não necessariamente surge para todas e por isso a importância do compartilhar informações porque no meio do caminho com toda certeza você vai encontra alguém que passou pelos mesmos perrengues.
No meu caso foram vários os efeitos colaterais que tive mais neste post falarei de um dos mais significativos que foi a queda de imunidade mais conhecida como neutropenia. E o que é a neutropenia? Trata-se da queda da contagem dos neutrófilos - um dos tipos de glóbulos brancos - responsável pelo combate de infecções no organismo. Logo, se a sua contagem de neutrófilos tender a diminuir e assim persistir, sua chance de adquirir infecções oportunistas durante ou após uma sessão de quimioterapia é grande e não é isso que os médicos desejam. Entende o porque da necessidade de se fazer um exame de sangue antes de começar o protocolo de tratamento? Se os valores dos neutrófilos estiverem abaixo do esperado, o tratamento é interrompido para que a medula seja estimulada a produzir novas células e assim tudo voltar a ocorrer conforme o planejado.
Oh Luana, além do exame de sangue, tem outra forma de saber se estou com um quadro de neutropenia? Te pergunto se seu médico lhe dá ou já lhe deu a instrução de que se sua temperatura chegar a partir de 38°C é pra você correr pro hospital? Pois então, geralmente a neutropenia vem acompanhada de febre, a chamada neutropenia febril, que é um sinal do corpo mostrar que está tentando combater alguma coisa no seu organismo. E todo mundo tem? Não! Eu por exemplo, tive alguns quadros de neutropenia severa e nenhum deles veio acompanhado de febre mais sim de dor abdominal. Isso mesmo! Dor abdominal e era uma dor tão específica que eu já sabia que quando começava era correr para emergência e a internação já estava certa.
Nem toda neutropenia apresenta quadro febril ou mesmo qualquer tipo de sintoma, o mais comum é identificar através de exame de sangue mesmo. Porém, quais seriam os sintomas que podem vir a acompanhar esse quadro? São eles: Arrepios ou transpiração, Dor de garganta ou úlceras na boca, Dor abdominal, Diarreia, Feridas ao redor do ânus, Dor ou ardor ao urinar, Tosse ou dificuldade respiratória, Vermelhidão, inchaço ou dor, especialmente em torno de um corte, ferida, ou do cateter e Corrimento anormal ou coceira vaginal. No meu caso, além do exame de sangue, a dor abdominal era sinal de que minha medulinha precisaria ser estimulada pra me ajudar a enfrentar um pouco mais o linfoma. Confesso que a única forma de conseguir descrever essa dor é como se fosse uma cólica super aguda, pois não tinha posição que me deixasse confortável. Dor abdominal para mim era sinônimo de 7 dias de internação + muito antibiótico na veia + 2 doses de imunoestimulador por dia = atraso de 15 dias no tratamento e isso acabou realmente prolongando o tempo esperado do meu tratamento.
Uma vez que já era recorrente quadros de neutropenia na minha pessoa, os médicos que cuidavam do meu caso me passaram o uso de uma solução injetável chamada Filgrastine ou como muitos conhecem o famoso Granulokine. No começo eram 4 doses em dias alternados após a quimioterapia, mas o bagulho ficou tão sinistro que chegou a uma dose diária por 10 dias após cada ciclo. Funcionou para mim e mesmo assim minha medula me pregava umas peças. Quem aplicava minhas injeções era meu pai e sempre na minha pochetinha da barriga que era divida em quadrantes imaginários onde alternávamos os furos já que todo dia era uma picadinha e vou falar pra vocês, tinha dia que era super tranquilo, mas tinha outros que a aplicação doía demais e eu não aguentava segurar o choro. Oh injeção enjoada!! Um efeito que sentia muito após as injeções principalmente depois que as doses passaram a ser diárias era dor nos ossos - quadril e lombar - e é algo completamente explicável uma vez que a medicação super estimula a medula óssea que é encontrada no interior dos ossos. Mas, o que é essa medicação? O que ela faz, a indicação? Confesso que só parei para me informar sobre tudo isso depois que meu pesadelo acabou e por isso agora venho de alguma forma informar a vocês que possam ter essa curiosidade.
O Filgrastine/Granulokine é uma solução injetável que pode ser administrada via intravenosa ou subcutânea e é indicada para reduzir a duração de quadros de neutropenia e incidência de neutropenia febril em paciente com neoplasias não mielóides com quimioterapia citotóxica estabelecida. O seu componente principal denominado filgrastim é uma proteína não glicosilada, produzida através de DNA recombinante e trata-se de um fator de crescimento hematopoiético que atua nas células precursoras formando apenas um tipo de célula diferenciada, o neutrófilo, logo, trata-se de um estimulante celular linhagem-específica. Essa glicoproteína recombinante regula a produção e liberação de neutrófilos funcionais da medula óssea para o sangue periférico provocando seu aumento em 24h. Esse aumento dependerá da dosagem estabelecida e após o término do seu uso, a quantidade de neutrófilos circulantes diminui cerca de 50% em 1 a 2 dias e volta a seus níveis normais de 1 a 7 dias. O uso de filgrastim por pacientes tratados com quimioterapia citotóxica leva a um menor número de internação reduzindo assim a quantidade de antibióticos que pode vir a ser utilizada pelo paciente. Não é indicado em pacientes com hipersensibilidade ao produto ou seus componentes nem em pacientes com histórico de púrpura trombocitopênica auto-imune, além de ser contraindicado em menores de 18 anos. Por ser um fato estimulante celular pode promover o crescimento de células mielóides e não-mielóides e devido a possibilidade de crescimento tumoral deve ser administrado com muita cautela em pacientes com características mielóides (leucemia). Deve ser utilizado após 24h da administração da quimioterapia e conservado sob refrigeração entre 2°C e 8°C ao abrigo da luz. É recomendado a realização de exames de sangue semanais para acompanhar a contagem de neutrófilos e caso for necessário realizar, o ajuste da dosagem. As reações adversas mais comuns são: náuseas/vômitos, cefaleia e dor músculoesquelético, além de algumas alterações no hemograma.
Perceberam os benefícios que uma espetadinha faz por nós durante o tratamento? Conheço pessoas que fizeram o tratamento todo sem precisar de nenhuma dose de filgrastine enquanto outras, como eu, precisavam tomar todo dia. Cada caso é um caso, cada corpo é um corpo, cada paciente é um paciente mais com toda certeza algumas das experiências serão comuns e compartilhar um pouquinho disso não custa nada. É dolorido relembrar e muitas vezes pensar sobre isso, mas sabendo que de alguma forma alguém possa se identificar ou mesmo ler e entender um pouco tudo que passei já me deixa feliz. Foi um caminho mais difícil do que eu poderia imaginar, mas sou agradecida por poder estar viva e poder contar minha história.
Obrigada Filgrastine por manter minha imunidade e obrigada corpo por continuar fazendo seu trabalho.
Com amor, Lua

Fontes:
Bula do Filgrastine
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